Dentre os problemas oclusais (de mordida) que podem ser encontrados nas arcadas, um deles é a incorreta relação das bases ósseas dentárias. Assim, o arco superior (maxila) e o arco inferior (mandíbula) não se encaixam de maneira adequada, causando uma alteração oclusal que ocorre normalmente durante o desenvolvimento das estruturas do crânio e da face. As principais causas para isso envolvem fatores genéticos, endócrinos, funcionais e ambientais.
Estes problemas, muitas vezes, passam despercebidos pelos pais ou até mesmos por dentistas não especialistas nesta área, pois os dentes podem estar bem alinhados e bem posicionados em suas arcadas, de maneira que se observa esteticamente um sorriso bonito. É aí que está o perigo, pois a função mastigatória pode estar totalmente comprometida e alterada, escondida atrás de “dentes retos” e por isso, os pais não buscam uma avaliação ou não compreendem a necessidade de uma correção da oclusão.
A arcada superior se encontra na maxila, que é formada por dois ossos geminados que estão unidos em outros ossos do crânio e da face. A arcada inferior, a mandíbula, é um osso móvel, inserido no osso temporal direito e esquerdo através de músculos e ligamentos da articulação temporomandibular. A maxila depende do correto posicionamento mandibular com a adequada relação dos dentes superiores e inferiores para receber os impactos dos movimentos mastigatórios para ter um bom crescimento e desenvolvimento.
Todas estas alterações estão fortemente relacionadas a má relação entre dentes superiores e inferiores, (denominada de má oclusão) a uma incorreta relação da articulação temporomandibular e a um mau condicionamento dos tecidos musculares da região de cabeça e pescoço envolvidos nas funções fisiológicas e funcionais do organismo, afetando consequentemente mastigação, fonação e respiração.
O inadequado relacionamento da maxila com a mandíbula ocorre no sentido vertical, ântero-posterior e no sentido lateral, podendo existir nos três sentidos concomitantemente.
No sentido vertical: mordida aberta ou mordida profunda
A mordida aberta consiste na ausência de contato do dente superior com o dente inferior, em que a mandíbula está afastada da maxila em alguma posição do arco oclusal. Na maioria das vezes, ocorre na região anterior, mas pode também se encontrar nos dentes posteriores. Muitas vezes é observado um “espaço” grande entre os dentes, com a ausência de contatos mastigatórios.
A mordida profunda é o oposto da mordida aberta, sendo que nesta situação a mandíbula está em uma posição vertical de encaixe exagerada em relação à maxila e os incisivos superiores recobrem os inferiores. Em casos acentuados, os dentes inferiores podem tocar a gengiva da região do céu da boca. A mordida profunda dificulta os movimentos mandibulares de mastigação e está muito relacionada as Disfunções Temporomandibulares.
No sentido ântero-posterior: Retrognatismo ou prognatismo mandibular
Os casos de retrognatismo mandibular ocorrem devido à falta de desenvolvimento da mandíbula. Esta, então, se encontra em uma posição posterior em relação a maxila. Muitas vezes os pacientes possuem um perfil facial convexo, com o queixo para trás e o nariz proeminente.
Já no prognatismo mandibular, a mandíbula apresenta um crescimento em excesso, ultrapassando a maxila no sentido anterior e pode estar associado a uma falta de desenvolvimento adequado da arcada superior. Visualmente, as pessoas ficam com uma aparência de “queixo grande” e face côncava, com o lábio inferior mais volumoso e proeminente.
No sentido lateral: mordida cruzada unilateral ou mordida cruzada bilateral
Em uma vista anterior, observa-se o deslocamento mandibular para o lado direito, esquerdo ou ambos os lados da arcada superior, causando a mordida cruzada unilateral ou bilateral. São alterações transversais dos maxilares, de maneira que os dentes inferiores se encaixam por fora dos superiores, contrariamente ao que seria correto. Muitas vezes, causa assimetrias na face e problemas articulares, uma vez que a mandíbula não funciona de maneira bilateral e alternada.
Tratamentos dos problemas de oclusão
A avaliação de um especialista deve ser feita o mais cedo possível e muitas vezes o tratamento Ortopédico Funcional ou Ortodôntico é indicado bem precocemente, independente da idade da criança e mesmo em dentes de leite ainda.
Uma das ferramentas mais utilizadas na Ortopedia Funcional dos Maxilares é o aparelho ortopédico funcional, que são aparelhos removíveis, não causam dor alguma e trabalham de maneira funcional e bimaxilar (sempre superior e inferior). Estes aparelhos estimulam neurônios sensoriais da região bucal, que levam a mensagem até o sistema nervoso central, e este responde remodelando estruturas ósseas, musculares e articulares.
Outro recurso que pode ser utilizado consiste nas Pistas Diretas Planas, através de alterações nos formatos dos dentes de leite com o acréscimo de resinas compostas, obtendo os contatos desejáveis entre dentes superiores e inferiores, usadas muito em casos de mordidas cruzadas e mordidas profundas. Além dos recursos terapêuticos, os pais deverão receber orientações quanto aos estímulos mais adequados para um bom funcionamento do sistema estomatognático, ou seja, dos músculos e estruturas envolvidos nos processos de mastigação.
Quando diagnosticados tardiamente, estes problemas de mau relacionamento das arcadas podem ter como única forma de tratamento a combinação de tratamento ortodôntico fixo associado à cirurgia, chamada de cirurgia ortognática. Esta é realizada nos terços médio e inferior da face para corrigir o posicionamento defeituoso dos ossos dessa região. Apesar de ser uma cirurgia de grande complexidade técnica, pode ser executada com muita previsibilidade e segurança.
Na arquitetura da oclusão normal, a natureza considera os dentes, as bases ósseas e a musculatura em uma relação de interdependência e perfeito equilíbrio. Para que ocorra o correto engrenamento dentário é importante que exista o devido posicionamento dos dentes nos arcos dentários, a relação de proporcionalidade da maxila e da mandíbula e adequada função muscular.
Inúmeros fatores podem estar ocorrendo para interferir no equilíbrio desse sistema, contribuindo negativamente para a oclusão e para a relação maxila-mandíbula. Alguns exemplos podem ser: a sucção de dedos e chupetas, posicionamento lingual inadequado, ausência ou perda precoce de algum dente, respiração bucal, fatores hereditários, traumatismos, enfermidades e alterações de desenvolvimento de origem desconhecida.